20 agosto 2013

Amebas que amam (2)

Essa citação lembrou minha postagem antiga Amebas que amam. Sim, a mentalidade de ameba que os livros de autoajuda refletem é o arremedo de amor que uma sociedade longe de Deus consegue produzir: "amorrrrr" que se opõe a racionalidade, diálogo e confrontação. 
Assistimos, de fato, a uma modificação substancial de sentido do conceito de "tolerância". Ele já não designa aceitação do "outro", da opinião diferente, mas pura e simplesmente ignorância (amável) da opinião diferente, a suspensão da diferença como diferença. Disso resulta que: 1) não tenho necessidade de te entender para te aceitar; 2) não tenho necessidade de discutir contigo para te dar razão. Dito de outro modo, estou de acordo com as coisas que não entendo e estou, em princípio, de acordo com os coisas com que não estou de acordo. O senhor tem direito à opinião do senhor. Respeito-a. Eu tenho direito a minha opinião e espero que ela seja respeitada. É inútil a dialética. A tolerância recíproca termina numa mudez universal, sorridente, pacífica, uma mudez porque o diálogo é uma interferência radiofônica indesejável. Nessas condições, a tolerância tem efeitos mais do que discutíveis: ela amputa o apetite de conhecimento, de compreensão real da alteridade, e dinamita a necessidade de debater. Para que negociarmos mais, se o resultado é, de qualquer modo, o consentimento mútuo ao direito do outro? Num mundo governado por tais regras, Sócrates ficaria desempregado. Não se encontra nenhuma verdade, não se faz nenhum raciocínio. Não se exige senão que respeitemos, educados, as convicções do interlocutor.
Andrei Pleșu, Da alegria no Leste Europeu e na Europa Ocidental. Trad. Elpídio Mário Dantas Fonseca. São Paulo, É Realizações, p. 72.

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