07 dezembro 2009

My Way e Comme d'habitude

And now, the end is near, and so I face the final curtain...

Quem não conhece esse que foi um dos maiores sucessos do Frank Sinatra tardio e uma das canções mais regravadas de todos os tempos? No leito de morte, o eu lírico da composição proclama orgulhosamente: I did it my way (em uma tradução desajeitada, "fiz do meu jeito", ou seja, "vivi a vida como me pareceu melhor"). Se a música fosse poesia, como crítica literária eu diria que se trata de um sujeito forte: seus arrependimentos foram muito poucos que valessem a pena mencionar; cada um de seus passos, tais como os do Chapolim, foram friamente calculados; se havia dúvidas, ele "engoliu e cuspiu", encarando tudo e permanecendo de pé; ri das derrotas e falhas; e termina seu relato dizendo que um homem que não tem a si mesmo é um homem que não tem nada. Ele morre sozinho, confiante e satisfeito. Uau!

Mas poucos conhecem essa que foi a matriz francesa para My Way, chamada Comme d'habitude, de 1967. Curiosamente, a letra original nada na contramão de sua irmã americana, ao descrever a vida de um casal cujos gestos cotidianos são desprovidos de significado. O eu lírico, dessa vez, é um marido deprimido e até conformado com o fim iminente de seu casamento. Diz a canção: "Como de costume, todo o dia/ Eu vou fingir/ Nesta cama fria/ Minhas lágrimas, eu as esconderei/ Como de costume." É o exato oposto do sujeito que toma as rédeas de suas decisões: em Comme d'habitude, o relacionamento sem vida é um subtema para demonstrar a impotência do homem.

Poderíamos dizer que ambas as canções ilustram os atuais modos americano e europeu de considerar o ser humano. Um é otimista demais, quase heroico; o outro, pessimista e até niilista. Porém, é mais interessante pensar que são duas cosmovisões contraditórias oferecidas por um mundo que só consegue enxergar o homem sem Deus. Separado do Criador, o homem pode aventurar-se pela vida crendo que é dele que depende seu destino; ou então, pode afundar em um surdo desespero ao perceber sua incapacidade fundamental para gerir seus próprios caminhos. Enquanto o segundo desistiu de tentar, o primeiro se satisfaz com muito pouco, refestelando-se nas próprias imperfeições e no orgulho de sua solidão. São dois extremos e nenhum deles é verdadeiro. Só o cristianismo é exato em sua radical afirmação: sem Deus, nada podemos fazer; com Deus, submetidos a Ele, podemos viver sem ganas de um falso heroísmo, descansados em Sua vontade e desejosos de Sua perfeição, em um amor que é real e plenamente vivido no Paraíso. Não há nada no mundo que possa comparar-se a isso.

8 comentários:

Mário Celso S Almeida disse...

A paranóica life style americana, de fato causa perturbações em muitas gentes...Se o cara não estiver vivendo aquele padrão tão sonhado do consumismo, ele não estará satisfeito...Enquanto que o padrão do meigo Nazareno é "segue-me" e com isso no "mundo tereis aflições"...Não se tornará tão atrativo o Evangelho descompromissado com os padrões europeus e americanos...

Mário Celso

Ricardo Mamedes disse...

Olá Norma,

Você traçou um paralelo deveras interessante ao partir das duas músicas para desaguar em Cristo.

De fato não há qualquer mérito se analisarmos as duas premissas secularizadas apresentadas por uma cosmovisão cristã, uma vez que ambas negam a essência da vida, ou dela se afastam: Deus.

No exemplo citado, enquanto um é autossuficiente, se bastando, o outro apenas se entrega ao nada.

A conclusão é que são dois extremos a desembocar em nenhum lugar, posto que o único que responde a todos os anseios do homem frente ao invisível e ao que sucede à morte física é Deus. A plena suficiência dEle em nossas vidas tanto nos resgata "aqui", como é uma promessa para o "porvir".

Razão pela qual concordo, 'in totum', com a sua afirmação final:

"Sem Deus, nada podemos fazer; com Deus, submetidos a Ele, podemos viver sem ganas de um falso heroísmo, descansados em Sua vontade e desejosos de Sua perfeição, em um amor que é real e plenamente vivido no Paraíso. Não há nada no mundo que possa comparar-se a isso."

NEle.

Ricardo

Eduardo Medeiros disse...

Por isso que é bom ler blogs de pessoas inteligentes: você sempre aprende alguma coisa que não sabia.

Agora, a sua afirmação de que "Só o cristianismo é exato em sua radical afirmação: sem Deus, nada podemos fazer" - se permite, creio que pode e deve ser relativizada.

Em que sentido você põe o "nada podemos"? se for um "nada podemos" em sentido de que sem cristo tudo o que se faz é existencialmente sem valor, permita-me discordar.

Creio que está na hora de assumirmos a responsabilidade que o Deus bíblico outorgou à humanidade: cuidar, gerenciar, produzir.

Podemos fazer tudo isso sem a tutela de Deus. Somos seres para a independência, mas teimamos em não crescer e "sair" da sombra Paterna.

Colega, se quiser e tiver tempo, leia a postagem em

http://saladopensamento.blogspot.com/2009/11/o-que-somos-nos-ou-voltando-missao.html


vou seguir seu blog, abraços

Norma disse...

Mario e Ricardo, é isso mesmo!

Eduardo, obrigada pelo "blog de pessoas inteligentes", mas antes de ler meu blog você precisa ler a Bíblia. Foi o próprio Cristo quem disse em João 15.5: "Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer." Jesus Cristo é Deus. Você acha que pode fazer algo substancioso e verdadeiro sem o próprio Deus? Repare que essa afirmação vai contra o que você citou sobre a "independência". Deus é o doador e o sustentador da vida. Independência de Deus significa morte.

Abraços!

Ricardo Mamedes disse...

Para o Eduardo,

Meu caro, segundo esse maravilhoso livro denominado Palavra de Deus, toda e qualquer obra nossa, separada de Deus, é para Ele abominável. O homem, enquanto pecador, aborrece Deus - e o aborrece desde antes de nascer, veja Esaú (Romanos 9)!

Deus não vê qualquer justiça em nós como pecadores ("não há um justo, um justo sequer); mesmo as nossas melhores obras, mesmo a nossa justiça, são para Ele como "trapos de imundície" (para citar aquela mesma "Palavra).

Logo, caro Eduardo, o seu tremendo erro é querer relativizar a "Palavra" com esse pensamento tristemente pós-moderno. Assim fazendo, você relativiza o próprio Deus.

Eu prefiro me denominar "um miserável pecador necessitado da graça de Deus continuamente".

Ricardo

None disse...

Uma interpretação interessante, Norma.

Mas sempre entendi a música My Way como uma declaração de independência frente a exigências sociais estéreis. Uma revolta contra o conformismo e a massificação. Viver intensa e verdadeiramente como ser humano, e não padecer como um bichinho indefeso.

E refletiria mesmo a biografia de uma pessoa virtuosa: assumir integralmente tudo de bom ou ruim que fez na vida, sem nada esconder, sem nada atenuar.

Claro, esta é apenas uma interpretação entre muitas, mas me parece plausível porque o mais absoluto desprezo pelo mundano é compatível com a mais completa submissão à vontade divina.

Já em Comme d'habitude, o fracasso é total. Não há hermenêutica que salve... :-)

um abraço,
Cláudio

Eduardo Medeiros disse...

Norma, valeu pelo "fora" rsssss olha, eu li a bíblia antes de chegar aqui, pode ter certeza.

E eu confirmo o que disse: Deus nos fez para a idependência.

"Moisés, porque clamas a mim? diga ao povo que marche"

Precisamos aprender a marchar sem a toda hora estar choramingando e suplicando ajuda a Deus para realizarmos aquilo que nós mesmos fomos feitos para realizar.

Vou fazer uma prova? o menino mimado pede ao pai para abençoá-lo para ele poder ser aprovado; o homem feito sabe que para se fazer boa prova, oração não resolve, só muito estudo e confiança.

Estou pensando em mudar de emprego? o menino faz 3 dias de jejum e busca a profeta para lhe dizer o que fazer, o homem feito faz análise de mercado, pondera, estuda, e toma a decisão

É nesse sentido que devemos ser independentes: não deixar para o "papai" resolver aquilo que é você mesmo que tem que resolver, salvo, é claro, se você for uma criancinha.

E quanto à dimensão espiritual, nesta sim não temos nada a fazer, pois a predestinação divina já fez tudo por mim.

abraços para todos.

Norma disse...

Eduardo,

Sim, devemos ser maduros, mas não "independentes".

Eu entendo a coisa assim: não somos sozinhos, mas Deus, em sua soberania, sempre está nos inspirando, instruindo e corrigindo.

Isso não significa auto-anulação nem inércia, mas o reconhecimento de que fomos feitos para andar COM Deus.

Abraços!